30 de junho de 2015

A areia enterrava-lhe os pés num calorento conforto enquanto em passos calculados percorria o areal. Tinha saudades daquilo. Não estava preocupado com o vento que se agitava.
Sentia-se livre e fresco como gaivota planando num oceano, estava em casa. 
A sua ligação com o mar ainda era considerada um mistério mas ele não o tentava resolver. Convencia-se que era coisa normal entre o povo português.
Inspirava fundo, tentando absorver todo aquele aroma já dele conhecido para mais tarde recordar.
Ao chegar, estendeu-se na toalha e aproveitou o que de falta sentia. O ar. O sol.
Aquele calor do final da tarde que não queima a pele mas que embala um sono superficial.
Sabe que a sua palidez não vence o mais fraco dos raios solares e por isso, com o nariz torcido, procurou na sua mochila o creme protector.
Nunca gostou dele. Sente-se pegajoso, sujo.
Mas hoje isso não importa. Até o cheiro que o remete à sensação odiada, é recebido com agrado.
Tem o mar ali.
Antes sequer de se despir, de se deitar e aproveitar o sol, cumprimenta o mar no silêncio dos seus pensamentos. Toca-o. O mar responde entre soluços frios, não muito, já sentira beijos mais gelados.

Se ele é feliz? Não, penso que não. Ele não acredita em felicidade mas sim em momentos felizes. Crê que a felicidade é a soma de pequenos momentos; sejam eles semanas ou apenas efémeros segundos. 
E por isso sorri. Sem razão ri-se; porque, como diz uma das passagens preferidas dele, "a felicidade pode ser encontrada mesmo nos momentos mais sombrios. Tudo que precisamos de fazer é lembrar-nos de acender a luz".
Ainda não conheceu nada mais luminoso que o sorriso.

Em momentos felizes, voláteis, o tempo ganha asas tal como os nossos sonhos.
É hora de voltar.
Evita tirar todos os pedaços de praia que estão agarrados aos seus pertences numa tentativa ridícula de manter-se em felicidade.


No caminho de regresso, relembram-lhe que não podemos ter orgulho naquilo que não podemos escolher. Ele não pôde escolher ser português e no entanto sente um enorme Orgulho nisso.
Enquanto olha pela janela, agradece novamente ao mar por tudo o que iluminou.

28 de junho de 2015

Não faças perguntas.
Não quero procurar respostas.
Se as sei, não as quero ouvir.
É sábado e vou directo a casa. Tomo um atalho já meu conhecido enquanto ando sobre os meus pensamentos. Desperto para a realidade ao ouvir risos de uma criança. Risos sinceros de quem não tem nada com que se preocupar. Gargalhadas de quem corre atrás de uma bola e não de um autocarro.
Estavam duas crianças dentro de um recinto de um parque infantil a rirem-se. Os seus pais corriam atrás deles, igualando a velocidade à dos mais pequenos, tentando apanhá-los. De vez em quando lá conseguiam travar as suas hipóteses de fuga por um reduzido espaço e aproveitam para desferir um golpe de cócegas ou fazer um ataque de beijinhos.
As crianças riam perante as investidas. Os pais sorriam vitoriosos com as risadas dos seus pequenos.
É sábado e uma família arranja tempo para rir.
Os mais velhos largam os seus afazeres, aproveitam o bom tempo e saem à rua para brincar. Atacando unicamente com carinho. Trazem alegria nos lábios e despreocupação nos bolsos.
Faço uma nota mental para dar aos meus o que nunca tive enquanto continuo a caminhar a rir-me como uma criança.

27 de junho de 2015

Sempre engoli as palavras a seco e a custo as acomodei no fundo da barriga.
Palavras que se vão entranhando aos poucos depois de se estranharem.
Palavras que vão sendo digeridas pelo tempo.
Evito regurgitar momentos que as palavras trazem.
Sem baldes de água fria, sem muita agitação, a digestão de palavras prossegue.
E continuo a engolir em seco palavras.

25 de junho de 2015

"Aprendi que não posso exigir o amor de ninguém.
Posso apenas dar boas razões para que gostem de mim...
E ter paciência para que a vida faça o resto." Shakespeare

Aguardo pacientemente.
Cá esperarei.
Pode ser que um dia seja poeta.

22 de junho de 2015

Estou sentado, torto e sem jeito a escrever. Não sei bem o quê, mas não me interessa. Deixo os meus dedos saltirarem pelo teclado livres.
Mal não farão, bem também duvido, mas enquanto saltam de um lado para o outro, fecho o olho e abro o ouvido. Tudo silencioso. Não se ouve nada além dos carros a correrem nas ruas e os meus dedos a saltarem nas letras. É de noite e os meus dedos não dormem. Os meus ouvidos continuam atentos. A quê? Não sei. Mas se não o estiverem corro o risco de perder algo.
Mas quem corre são os carros e quem saltita são os dedos. Eu só tenho os olhos fechados.
Sinto-me estúpido. Mas sinto-me bem. Escrevo sobre nada.
Dá-me uma noite e eu farei dela uma história para contar.

19 de junho de 2015

Sem vós, as palavras não existem.
Sem voz, as palavras calam-se.
Uma voz sem palavras, vale o mesmo que palavras sem vós. Nada.
Uma canção sem voz não existe, é preciso cantar palavras.
Sem vós, as palavras calam-se.
Sem voz, as palavras não existem.
Vós pondes palavras na voz e ponde-vos a vós nas palavras.
Palavras sem vós não valem nada.
Deixai um bocado de vós nas palavras e ganharão voz.
É preciso cantar palavras.

18 de junho de 2015

Caneta sem tinta não escreve palavras, arrasta-se pela folha.
Lápis roído interpreta dizeres desconfiado.
A primeira permaneceria se dela houvesse, contando uma história a quem a quisesse, ler.
Lápis na boca mordido mostrava um sinal escondido de descontracção.
De trabalho seria se fosse posto ao ouvido balanceando-se na orelha, olhando de esguelha a sua obra.
Lápis sem tinta não se arrasta, escreve. Pincela formas esquisitas a que poderão chamar letras quando afiado.
Quando ponta não há, rios de grafite nascem do carvão. Escrever não faz sentido se as palavras forem em vão e ninguém as conseguir ler. Ou mais sentido fazem se nos aprazem ao tentarem descodificar o nosso código.
Descodifica-me.

" "Não escrevo para agradar nem para desagradar. Escrevo para desassossegar"-me, porque por mais que pense em libertar-me dos pensamentos que me tomam a mente de assalto, através da defensiva da escrita, torno a fazer algo que me irrita: pensar. Algo que me limita impedindo-me de acabar o que estava a fazer.
Tal como sapatos apertados me impedem de andar."

17 de junho de 2015















Fumo-te sem filtro para que te possas infiltrar em mim
O teu perfume vicia-me os pulmões e mais puxo por ti;
aspiro-te num único trago, como se do último cigarro se tratasse.
Devias vir com um aviso para eu ignorar.
Preenches-me a mente e o meu pensar.
Vicias-me.
Como alcatrão que não me cria estradas, entopes as entradas dos meus pulmões roubando-me o ar.
Nicotinas-me a vontade de te fumar.
Vicias-me e eu fumo-te sem filtro.

15 de junho de 2015

Liga o brilho da televisão falante que traz a luz sonante das notícias.
Conversa com o empoeirado sofá que foi bem tratado quando era jovem e as suas pernas de madeira não rangiam.
Não se senta lá ninguém. Ou porque o sofá é velho ou porque velho é o rabo de quem lá se senta e não se consegue levantar. Ou porque as pernas ligadas ao velho rabo também velhas são e rangem ao andar.
Prefiro o tipo de ligação da televisão.
Os tapetes servem de cortinados ao taparem o fraco sol que não ilumina a casa.
A luz amarelada do candeeiro da mezinha de cabeceira tã pouco faz o seu dever. Outrora fe-lo.
Antes de acender escuridão. Fundiu.
Para ler connosco serve apenas como companhia e não como utilidade. Um candeeiro não lê às escuras. E eu também não. Afastar o tapete serve o meu propósito tão bem quanto o candeeiro.
Embora esteja calor, o varão das escadas abana-se com o vento. Não transpira. Suo eu quando subo as escadas para o sotão desabitado. Cada degrau é uma prova de sobrevivência, um desafio à vida. Ameaçam fazer-me uma rasteira de cada vez que lhes pouso os pés em cima. Já não estão habituados.
Continuam a refilar. O varão continua com calor e eu continuo a transpirar. Não me atrevo a segurar a vara, não vá ela largar-se e levar-me com ela. É uma falsa amiga. Temo que tenha nela um guarda-costas que me ataca pela frente.
Uma cama dorme entre as quarto paredes idosas que de lá nunca saíram. Não me dou ao trabalho de procurar uma almofada amarrotada entre o monte de lençois, mantas e outras almofadas com a fofura de tijolos partidos. Estou cansado e são horas de dormir.
O cuco ainda não saiu. Também ele já deve estar na cama.
Faço-lhe companhia.
"É uma coisa terrível, penso eu, esperares na vida até estares pronto. Eu tenho a sensação que, na verdade, nunca ninguém está pronto para fazer seja o que for. Não existe tal coisa como "estar pronto". Existe apenas o "agora". E mais vale faze-lo agora. Em geral,  o "agora" é tão adequado como qualquer outra altura."
"Trocaram-me os sapatos.
Sempre andei com eles, mas agora doem-me os pés.
A sola está gasta e contudo aparentam estar novos.
Tenho os pés calejados. Trago uns sapatos apertados.
São meus, não são os mesmos. Trocaram-me os sapatos.
Estou amarrado. Os atacadores prendem-me ao chão e não consigo avançar.
Estou amarrado, calejado e doem-me os pés.
Onde estão os meus sapatos?"

14 de junho de 2015

Muitas vezes falas contigo quando estás sozinho.
Mas acompanhado ou não, conversas-te.
Tens grandes debates e discussões que os outros não têm a possibilidade de ouvir.
Ganhas sempre. Perdes sempre.
Não expões os argumentos às paredes das ruas.
Elas têm ouvidos e julgam-te depressa.
São sábias numa experiência que não têm.
Palpitam e não têm coração. São paredes.
Queria-as como suporte, mas são apenas divisórias, muros que nos separam.
Não escutam.
São paredes.

13 de junho de 2015

"Quem ama à chuva constipa o coração. Não te demores a estacionar o coração em becos sem saída.
Quando sentires o frio roubar-te o calor da pele ou um calafrio a brincar na tua espinha, abriga-te.
Não te quero com uma constipação doente.
Não te aproximes da minha solidão se não for por amor.
Nada te vale engolir versos como se de beijos se tratassem."

"Caminhos de calçada nunca percorridos e becos esquecidos são enfeitados em dia de festa de Santo, onde aqueles que não o são saem em pecado nas ruas descalças de sentidos.
A sobriedade não adorna as ruas. Reparo na quantidade de pessoas que fazem questão de agarrar os postes para que eles não caiam. Pergunto-me se alguma vez desmaiam.
Vêem-se pessoas nuas,  escutam-se gracejos impróprios. Tem-se cuidado para não pisar o grego do chão enquanto o português continua de pé, não sei por quanto tempo.
Cheira a festa e a gente. Sou convidado a entrar por ruas cujo nome esqueci para me perder.
Encontro-me rodeado de pessoas estranhas que não mo são. Diferentes diria; estranho sou eu.
Continuo como um plebeu pelas ruas que a cidade faz questão de apresentar.
Percorro-as numa sobriedade bêbeda a cantar. Converso-me sem estar esdrúxulo.
É grave."

12 de junho de 2015

I don't even know you.
Walk with me tonight and I'll show you,
how much fun can we get, going around the city,
I bet you will find it pretty as much as I do.

Am I supposed to get to know you?
Without knowing who am I ?
Let's get out, let's have fun
let time passing us by
and when we're finish and done
I don't know who I'll become
I will still not know you
and will not know who is this person inside
I keep on asking my mind
But she doesn't give me any answer
She gives me questions instead,
Leaving me half alive half dead,
Without knowing what to do,
I try look for answers, look for tips,
The only thing I can remember is the touch of you lips
Which I never touched but I wished to.
Let's have some fun, just one street dance,
Tonight.



"O chão não é silencioso
e range quando eu, inerte, me espio.
As tábuas que jazem a meus pés
gemem despertando-me para a minha presença.
Mais uma vez não me conheço.
(O que há para além de tentar?
O sucesso? A morte?
E não é a morte o sucesso de viver?)
Tanto me espio como me perco de vista.
Vejam-me. Olhem para mim!
Vá, olhem e digam-me o que vêem.
O que é que eu sou, que não sei ver?

Soubesse eu conhecer-me em versos."

11 de junho de 2015

O cheiro da cidade cansada esconde-se no aroma da primavera;
Deambulam por aí, arrastados.
Quem lhes dera.
De olhos em baixo, pescoço descaído, pés pelo chão
Pensam no ontem ou então, num amanhã hipoteticamente melhor.
Não sabem; mas quem lhes dera.
Quem escreveu o seu destino era maneta ou tremia tanto que a caneta, dançava no papel enrugado.
Sobre linhas tortas se desenha a vida continuamente e na inexistência de réguas ou esquadros vivem-se momentos amargos nas ruas da nossa mente.
Perdemo-nos nelas. Sei que custa de lá sair, mas não sei se assim o queremos.
Tudo o que fazemos faz-nos embrenhar mais nessa floresta escura, entrar no labirinto que perdura, encontrar o lago da amargura. E é aí que choramos.
Encontramos a lagoa das nossas lágrimas interiores, dos nossos medos e terrores.
Aqueles que não contamos a ninguém. Sentamo-nos à margem e esticamos a cabeça na esperança de ver algo que nos faça sentir bem. Vejo uma imagem na água reflectida. Somos nós. Eu a olhar para mim. Pareço cansado. Estou cansado.
Uma gota escorre na minha face e faz o seu caminho até ao lago. Não é algo que me embarace.
Ao tocar a água, forma uma série de perfeitos círculos à sua volta. Até a tristeza tem a sua perfeição.
Tenho fome e não tenho nada para comer.
Dão nozes a quem dentadura tem que usar. Tudo lhes é dado e não o sabem, ou pior, não querem aproveitar.
São alérgicos talvez.
Mas quem lhes dera.
Sinto cheiro da cidade cansada escondido no aroma da primavera,
Lembro-me das pessoas de olhos baixos, pescoço descaído e os pés pelo chão.
Deambulam por aí, arrastados.
Quem lhes dera.

9 de junho de 2015

A força do olhar era fascinante. Não eram precisas palavras. 
O sorriso, aberto para a noite, falava por si.
Estavam bem. 
Estavam felizes e isso deixou-me genuinamente alegre!

 O ponto alto da noite foi poder presenciar a troca de emoções e sentimentos com pequenos toques ou longos olhares. 
Buscavam os olhos um do outro, procuravam o corpo do parceiro. 
Poesia.
Um dia serei poeta.